Foi-se o tempo da simplicidade. Foi-se o tempo em que a palavra de honra de uma pessoa valia mais que sua própria vida. Foi-se o tempo em que o homem acreditava no... homem.
Pensei nisso ontem, em meio ao difícil processo de se trocar um carro velho por um novo. Quase um escambo... Algo tão antigo quanto nossos ancestrais portugueses e indígenas.
A negociação inicial parecia tão simples: você deixa seu carro, pelo valor de tanto, e leva o novo, pagando a diferença de tanto.
Simples, não?
Mais ou menos.
O passo seguinte vem por fax, acho que para evitar o xingamento do cliente e uma possível agressão física. (É como ter que ligar para alguém com quem você não quer falar, o grande alívio de se cair na caixa postal... Ufa...) Uma lista imensa de documentos que devem ser entregues para se liberar o produtinho novo... Claro que certos itens são até compreensíveis.
-Manual do carro, chave reserva, documento original transferido e autenticado, porte obrigatório (sim, como o de armas... O documento que você lava na carteita se chama porte obrigatório...), DPVAT pago e guia de multas pagas. Então você se depara com os seguintes itens:
-Revisão de motor, feita no posto DINHEIRO FÁCIL, na avenida BUROCRACIA, número X! Valor a ser pago: 40 reais.
-Certificado de IPVA pago de 2005, 2006, 2007..... (caso o cliente não possua, pagar taxa de 30 reais na Secretaria da Fazenda para adquirir)
A grande vantagem de ser Jeca, nessas horas, é a facilidade em se resolver tais questões.
Cartório sem fila, cidade sem trânsito, você no balcão às 10h30 e sua aula começa às 10h50. Você chega atrasada? Não... Chega uns minutinhos antes, com tudo resolvido, e ainda toma um cafezinho.
Então deve ir à cidade vizinha onde está o tal posto da secretaria da fazenda... Outra vantagem de ser um paulistano morando no interior é a capacidade impressionante de se locomover em lugares desconhecidos. Para quem morava no Morumbi e teve que ir até Arthur Alvim ver o boleiro do casamento, ir de Itatiba a Jundiaí é melzinho na chupeta. Umas referências dadas e pimba, chega lá em 25 minutos.
Aí o bicho pega. Pode ser da metrópole, da roça ou de qualquer outro canto desse Brasil Baronil, somos todos filhos da burocracia nacional!
Fila na Secretaria da Fazenda? Nenhuma. O senhor de óculos que mal te olha no rosto preenche o pedido dos comprovantes de 3 anos de IPVA, você acreditando que serã tão fácil quanto chegar até lá. De repente, ele muda o tom, e diz:
"Olha, aqui é assim que funciona. Você leva estes formulários, preeenche, traz uma cópia dos seus documentos autenticada e paga as taxas no banco. Aí volta, protocola e nós encaminhamos para fazer o comprovante."
Você olha de novo o pedaço falho de fax com as instruções e pergunta:
"As taxas? Não são só 30 reais?"
"Sim, 30 reais para cada ano solicitado..."
Ah, váprapatacapara!
Mais urbana que Jeca, você sai em direção à concessionária, que fica ali perto. Irada, bufando e ensaiando no carro o discurso.
Chega e vê o vendedor que vem falando com você há dias, e todo dia faz a mesma pergunta: "E o bebê? Como está?"
"Olha, até onde chequei ainda está aqui. De ontem pra hoje ainda não saiu, e acho que ainda vai demorar pra sair."
Claro que isso você só pensa, mas já chama o rapaz na chincha, que papo é esse de me fazer gastar 90 reais de comprovantes mais 40 de inspeção no carro, se tenho os documentos aqui? Se o governo me deu os documentos quer dizer que paguei a porra do IPVA, então se ele quer mesmo que eu busque os comprovantes, vai ter que descontar do preço do carro!
Jeca geralmente tem medo de bronca, não gosta muito de conflito, e logo o rapaz resolve, e "pra você a gente dá um jeito..."
Dar jeito? Não estou pedindo tratamento especial, mas justo.
Saí mais calma, porém não menos revoltada com nossa cultura burocrática.
Em homenagem a isso, deixo com vocês um vídeo excelente dos meus portugueses queridos, para o final de semana...
Inté!
Um comentário:
A interminável burocracia brasileira no seu melhor! :)
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