Eu amo trabalhar com adolescente por inúmeros motivos, mas talvez o maior deles seja justamente o fato de eu amar lembrar da minha adolescência.
Foi linda, horrorosa, angustiante, sensacional, cheia de amor, sem amor nenhum, feliz e absolutamente deprimente. Ou seja, uma adolescência como outra qualquer.
Claro que como toda menina de 16 anos, meu maior alvo de revolta eram meus pais. Quem mais seria? Quem mais na Terra poderia me atrapalhar tanto quanto eles, os vilões, os carcereiros dos meus pais?
O causo que mais gosto de contar foi de um namorado que tive.... (aliás, tem causo melhor que de ex namorado?)
Conheci ele na porta da escola. Não, ele não era aluno da escola elitizada que frequentei. Ele era mecânico em uma rua do lado. Mecânico sim, não me venham com preconceitos. Ele era lindo, cabeludo, e cheio de graxa. Tinha nome de batismo, lógico, mas o apelido era a pimenta que faltava naquela moqueca: Punk'eca. Sim, panqueca.
Ela era amigo de uma amiga, e me lembro do dia que ele foi conhecer todas as meninas do grupo, no portão da escola. Como toda adolescente bem resolvida (SQN) eu tinha certeza que ele ia amar outra do grupo, bem mais bonita que eu. Qual não foi minha surpresa quando soube que ele queria sair COMIGO. COMIGO. Eu, euzinha....
Xonei. Eu 16. Ele 24....
16.... 24.....
Estudante, filhinha de papai. Mecânico, cabeludo, sem nome. Cheio de graxa. Ou seja, é ÓBVIO que meu pai ia amaaaaarrr ele tanto quanto eu amaaaavvvvaaa.... Era ou não era o genro que ele pediu a deus??? O que poderia dar errado???
Tudo...
Passei 8 meses namorando um pária. Ele não entrava em casa, eu não podia sair. A santa da minha mãe acobertava, e eu ficava na porta da cozinha, olhando por baixo do portão de casa, vendo a roda do Alfa Romeo passar na lombada pra eu sair correndo com o príncipe encantado que só meu pai não reconhecia.
Foi o romance mais delicioso "evah", cheio de declarações (e traições...) na rua, e uma guerra em casa. Ingredientes perfeitos para uma adolescente dramática.
Sorte do meu pai que um dia minha cabeça pesou demais e eu acabei o namoro. (Peso na consciência, não, peso peso mesmo. Chifre. Muitos.)
Mas o mais interessante ainda está por vir.
Um ano depois, eu chego em casa e meu pai, todo sorridente, vem me dizer que um rapaz muito simpático tocou a campainha em casa. Um rapaz de terno, gravata, educadíssimo.
-Quem era pai?
-Um tal de Marcus Vinícius.
-Marcus Vinícius, pai????
-É gostei dele. Fala bem, bem apessoado.
-Pai. Senta. Marcus Vinícius é o Punk'eca.
Sentei-me ao lado do velho. Enquanto ele digeria o que quer que seja que ele precisava digerir, eu fazia uma grande descoberta. Não queria o Marcus Vinícius. Queria a graxa que incomodava meu pai. Queria mais provocação que a paixão. Senti um certo vazio, mais ainda no olhar confuso do meu pai, que devia estar revendo alguns conceitos dele que eu, filha, não imaginava que precisassem ser revistos.
Gostaria de ter descoberto naquele momento o que hoje sei. Que todos nós somos Punk'ecas e Marcus Vinícius. Que todos nós nos reinventamos e somos bem mais que aparentamos. E mais, que todos nós somos Antônios e Tatianas, que dão murro em ponta de faca até perceber que a faca pode ser redonda. Dói tão menos.
Mas não percebi nada disso. Dei um tapa no ombro do meu pai e transformei isso na piada da família. Em alto teenage style me senti vitoriosa.
Ou não.
Sei lá.
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